sexta-feira, 29 de maio de 2015


FEMINISTA, POR QUE NÃO?
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Antes de mais nada, preciso alertar às leitoras e aos leitores que as ideias sobre o que é feminismo aqui expostas são bem particulares. Tudo o que aqui está representa pura e simplesmente o meu horizonte de compreensão.
Prosseguindo.
Estava viajando nos meus pensamentos quando cheguei à seguinte problematização: por que é tão difícil se reconhecer feminista? Qual é a dificuldade que têm tantas mulheres (não vou entrar no mérito dos homens porque é assunto para outro artigo!) para se identificar, talvez, não com a causa do feminismo, mas com o adjetivo em si e dizer “sou uma mulher feminista”?
Notei, em minhas leituras (tanto acadêmicas quanto Facebookeanas), alguns argumentos recorrentemente apontados para essa causalidade. Um deles é o fato de que, nascendo e se desenvolvendo num mundo fundamentalmente sexista, todo o arcabouço discursivo em que nos encontramos é, consequentemente, também sexista. Vamos, então, nos constituindo enquanto pessoas, nos relacionando e nos contextualizando através de palavras, gestos, visuais, comportamentos, enfim, linguagens carregadas de sexismo. Logo, a menos que uma mulher entre em contato com um mundo semântico alternativo, dificilmente poderá instrumentalizar sua insatisfação com o estado de coisas.
Outro motivo levantado é que o movimento todo é muito associado ao “feminismo radical”. Não falo da radicalidade daquelas que querem meramente inverter os sinais da equação e empreender um projeto de dominação-exploração dos homens (não sei nem que nome daria a essa “vertente” que, por sinal, me parece bem inexpressiva), mas do feminismo de segunda onda, iniciado nos anos 60 e 70, aquele que nos falou do patriarcado como causa da opressão feminina. Em uma das minhas observações mais-do-que informais de discussões na internet, notei algumas mulheres desconfiadas desse tipo de colocação. Uma afirmação comum era de que tais feministas veem opressão em tudo – uma delas chegou a dizer: “vocês enxergam opressão até numa banana, só porque tem formato fálico”. Ok.
Bom, meu propósito não é desqualificar tais argumentos; é aventar mais uma possibilidade. Um obstáculo ao qual não se presta muita atenção, mas que engendra muita resistência, é o “ista” de feminista. Primeiro, porque muita gente já está farta de ver uma diversidade de opiniões e convicções, tão complexas e cheias de nuances, separadas de modo bruto em caixinhas. Muitas pessoas simplesmente não querem ser rotuladas. Uma outra razão se percebe ao identificar, em grande parte dos “ismos”, uma associação bastante negativa: racismo, chauvinismo, fanatismo, terrorismo. O próprio sexismo, claro. Lembro que a palavra homossexualismo foi abandonada por ser patologizante; hoje, falamos em homossexualidade ou homoafetividade. Os ismos não são bem recebidos.
Daí é que eu comecei a entender um montão de mulher que eu conheço. Elas têm uma atitude bacana, brigam por seus direitos, criticam comportamentos machistas, mas preferem não se dizer feministas. Abraçam a causa, mas não a qualificadora. E foi aí, também, que eu comecei a bolar alegações para demonstrar a necessidade de abraçar o feminismo por inteiro, adjetivo e tudo.
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Pelo visto, não só eu. Uma série de personalidades famosas, peças publicitárias e Organizações Internacionais iniciaram, nos últimos tempos, fortes campanhas em favor do feminismo. Nesses dias, vi que o pessoal do site BuzzFeed fez uma boa jogada: adivinhar se alguém é feminista pelas respostas a duas perguntas: 1) Você é um ser humano? 2) Você acredita na equidade social, política e econômica entre os sexos?
Fantástico. Só que, embora ache maravilhosa a formulação “se você é a favor da equidade de gênero, você é feminista”, creio que, na verdade, ser feminista seja mais que isso. Não se trata, apenas, de concordar com a igualdade. Trata-se de reconhecer que há uma desigualdade.
A verdade é que eu também não me dizia feminista até algum tempo atrás. Adotei o rótulo depois que tive ciência de que mulheres ganham 77% do que os homens ganham, que 1 em cada 3 mulheres é vítima de violência conjugal e 1 a cada 3 vítimas de tráfico humano é mulher (números mundiais). Mas não paro por aí, nos dados mais brutalmente chocantes. Precisei me dizer feminista porque reconheci a desigualdade por todos os lugares. Aguçando os sentidos, outras mulheres poderão reconhecer, também.
Andando pela cidade, notarão que os nomes de Ruas, Avenidas e Praças são nomes de homens. Perceberão que os seus corpos são policiados e constrangidos: os mamilos não podem sequer transparecer pela blusa, mas seus amigos não têm esse problema (e podem até tirar a camisa no meio da rua, se estiver fazendo calor). Prestando bastante atenção, ouvirão que “é muito feio ver uma mulher fumar” (mas homens fumando são a visão do paraíso, sim?). Repararão que, na TV, os experts convidados são majoritariamente homens, para falar de qualquer assunto (que não seja maternidade). Fazendo isso, é com muito pesar que ouvirão, de algumas amigas, que “mulher nasceu para sofrer”. E será, talvez, com muito orgulho, que se denominarão feministas. Quem sabe?

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